Diante da ascensão dos formatos rápidos como o blitz e o rápido, além da crescente popularidade do estilo freestyle, o xadrez clássico parecia estar perdendo espaço e interesse. No entanto, essa forma tradicional do jogo tem lutado com garra para se manter relevante — e até Magnus Carlsen ainda não desistiu dela.
Durante o Superbet Chess Classic, no mês passado, o lendário Garry Kasparov, 13º campeão mundial de xadrez clássico, afirmou com seu tom característico: “Cada torneio prova que todos os rumores sobre a morte do xadrez clássico foram muito exagerados.”
Desde então, os acontecimentos no circuito de xadrez, especialmente no torneio Norway Chess, só reforçaram essa declaração. Magnus Carlsen saiu vencedor do torneio, mas a conquista só veio nos momentos finais da décima e última rodada, em um dia em que quatro jogadores ainda tinham chances reais de levar o título.
Nos instantes decisivos, Carlsen — que já havia vencido o evento em casa seis vezes — precisou se inclinar para observar outros tabuleiros, tentando descobrir se Gukesh, seu principal rival naquele momento, estava prestes a vencer ou empatar. O desfecho foi digno de uma foto-finish, prendendo a atenção de todos os espectadores.
O início do ano já havia trazido um clima semelhante com o Tata Steel Chess, outro torneio clássico, em que a decisão do título veio apenas nos desempates. Na ocasião, Praggnanandhaa derrotou Gukesh para se consagrar campeão. Vale lembrar que Gukesh havia liderado boa parte da competição em Wijk aan Zee.
No Norway Chess, o enredo foi ainda mais imprevisível. A liderança do torneio mudou de mãos diversas vezes, e várias partidas foram decididas por pequenos erros, com apenas uma peça movida incorretamente sendo suficiente para selar o resultado.
Nas últimas décadas, o xadrez clássico vem perdendo espaço para formatos mais rápidos. E nos últimos doze meses, o estilo freestyle — com regras mais livres e menos tempo — também avançou com força. As duas maiores estrelas da atualidade, Magnus Carlsen (número 1 do mundo) e Hikaru Nakamura (número 2), chegaram a declarar publicamente seu desinteresse crescente pela modalidade clássica.
Mesmo assim, o Norway Chess mostrou que o formato tradicional ainda é capaz de provocar reações intensas — até mesmo nos jogadores que alegam não se importar mais com ele. Tão intensas que, após uma derrota, podem levar um jogador a socar a mesa de frustração.
Carlsen, que já havia expressado há anos sua frustração com o excesso de teoria nas aberturas, a preparação exaustiva e a falta de espaço para a criatividade, teve um desses momentos emocionais. Mas ele não foi o único. Após sua última partida, e ao perceber que não venceria o torneio, o atual campeão mundial Gukesh precisou de alguns minutos para se recompor diante do tabuleiro antes de deixar a sala de jogo. Nessa mesma rodada, até o sempre expressivo Nakamura se mostrou inconsolável por alguns minutos — uma cena rara para seus padrões.
Apesar das críticas e do desgaste, a mais recente edição do Norway Chess comprovou que, com alguns ajustes — como mudanças inteligentes no controle de tempo —, o xadrez clássico ainda tem muito a oferecer. E, mais do que nunca, ainda é capaz de emocionar até os maiores nomes do esporte.